
Crescem os pedidos de recuperação judicial de produtores rurais
[…]; a recuperação judicial do produtor rural pode ser traduzida na autorização de um plano para o pagamento mensal de todos os seus credores sem o comprometimento de toda a sua renda.
O furto de gado, ou abigeato, é um crime que tem aumentado durante a pandemia, o que vem causando grandes prejuízos aos criadores em diversas partes do país. Investigações policiais já apontaram que até mesmo facções criminosas têm praticado esse tipo de crime com o propósito de capitalizar o tráfico de drogas em decorrência do valor significativo dos animais.
Esse crescimento dos crimes rurais comprova a já conhecida tendência de interiorização da violência, uma vez que as pequenas cidades e as zonas rurais chamam a atenção dos criminosos por conta do menor policiamento ostensivo em comparação com os grandes centros urbanos. Isso equivale dizer que os criminosos têm se aproveitado da distância do Poder Público no meio rural para praticar crimes que lhes trazem alta rentabilidade.
É preciso que se entenda que o furto de gado não provoca perdas patrimoniais apenas aos pecuaristas, mas, também, a todo o sistema tributário nacional por ocasião da sonegação de impostos, bem como danos à sociedade em geral. E mais, como o comércio clandestino da carne furtada também oferece sérios riscos aos consumidores que adquirem e consomem esses produtos sem procedência e controle de qualidade, o furto de gado é prática que ainda traz riscos à saúde pública (em muitos casos, a carne é tão imprópria para o consumo que chega a possuir forte odor de podridão e urina, dado o abate precário dos animais).
Ainda falando sobre saúde pública, os ladrões de gado chegam a abater os animais furtados dentro do período de carência de medicações para o combate de parasitas, em descompasso com a recomendada quarentena de 120 (cento e vinte) dias para fazê-lo, o que leva ainda mais perigo a quem consome essa carne ilegal, já que pode adquirir algum transtorno em seu organismo em razão do consumo de carnes com alta carga de medicamentos.
A despeito disso, visando proteger o direito de propriedade do produtor rural e combater violações à saúde pública, foi editada a Lei n.º 13.330/2016, cujo teor alterou o Código Penal para tipificar de forma mais gravosa os crimes de furto e de receptação de semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes.
Essa medida é importante porque esse tipo de crime tem execução rápida, o que dificulta a ação da polícia. Não raro, os criminosos abatem o gado ainda dentro da propriedade rural, levando somente as carcaças dos animais para a venda ilegal em açougues e mercados. Em outros casos, aproveitando-se da grande extensão territorial de algumas propriedades rurais, os ladrões de gado cortam cercas e embarcam os animais com a ajuda de caminhões sem serem percebidos, sendo comum, nesses casos, a “clonagem” dos animais por meio da remoção da marca original sobre o couro e impressão de outra no local.
Com a Lei n.º 13.330/2016, a fiscalização da procedência da carne vendida nos estabelecimentos e a rígida punição de quem compra esses produtos servem de coação à prática desse crime, já que, nesses casos, os receptadores não conseguem comprovar a procedência das carnes por eles comercializadas. Ou seja, o endurecimento da punição do receptador de carnes furtadas tende a inibir esse tipo de negócio ilícito na medida em que desestimula a compra de carnes sem procedência a preços mais convidativos.
Todavia, embora a mencionada providência legislativa e a investigação policial sejam importantes ao combate ao abigeato, o que se vê é que a melhor alternativa continua sendo a prevenção e a adoção de cuidados para evitar esses prejuízos.
O que causa surpresa e gera revolta é que, na maior parte das vezes, as informações para a ação das quadrilhas especializadas vêm dos próprios funcionários e até mesmo de parentes e amigos próximos dos pecuaristas, sinalizando a necessidade de atenção e de uma minuciosa seleção dos profissionais que vão trabalhar nas propriedades rurais.
Esse destaque é importante porque, muitas vezes, os produtores rurais sequer verificam quem estão colocando dentro da sua propriedade, desconhecendo, portanto, se estão contratando alguém que, eventualmente, já praticou algum crime e, em razão disso, esteja foragido. Nesses casos, há tanto funcionários que são corrompidos por bandidos que facilitam o furto, quanto falsos caseiros que conquistam a confiança do fazendeiro para roubá-lo. Por isso é que se diz que essa indiligência pode dar azo a grandes prejuízos ao bolso dos pecuaristas.
Na prática, a locomoção de pessoas desconhecidas nas proximidades das propriedades rurais pode ser um indício da preparação para esse tipo de crime, o que é um alerta para a comunicação do ocorrido à polícia e a outros proprietários rurais vizinhos, bem como a utilização de cadeados nas porteiras e a instalação de dobradiças que evitem o desencaixe.
Por outro lado, como a comunicação entre os pecuaristas e as autoridades policiais é, geralmente, muito difícil, já que há locais em que as operadoras de telefonia não têm sinal, é bem-vinda a solução encontrada pelos produtores rurais dos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, onde foram criados programas de patrulhamento rural, com a utilização de GPS para ajudar a polícia a identificar as propriedades e prestar socorro com mais rapidez, bem como a contratação de vigilância particular. Os mecanismos de proteção incluem ainda a criação de grupos de WhatsApp nos quais os produtores trocam informações, além da instalação de alarmes e câmeras.
Outra novidade tecnológica já utilizada por muitos fazendeiros é o monitoramento do gado através de um chip inserido no animal para o rastreamento.
O compartilhamento das experiências é, também, muito importante na redução da criminalidade no campo, já que o fazendeiro que já foi vítima do abigeato pode ajudar na identificação do ladrão de gado, no alerta a outras propriedades e na construção de medidas públicas de segurança.
No âmbito jurídico, identificada a prática do furto de gado e a consequente comunicação da polícia para a oportuna investigação, é importante que o produtor rural adote medidas assecuratória para viabilizar a futura recomposição de seu patrimônio.
Isto porque é comum que o gado furtado seja imediatamente abatido e vendido. Somente após a realização das investigações policiais e a conclusão do inquérito destinado à apuração dos elementos que comprovem a autoria e a materialidade do crime é que será proposta a competente ação penal, quando, então, encerrada a instrução probatória, será prolatada sentença penal condenando os autores do crime a, também, indenizar a vítima. Essa indenização deverá ser reclamada posteriormente por meio de uma execução junto à esfera cível.
Essa narrativa é suficiente para que se observe que, até que se chegue na referida fase executiva na esfera cível, o decurso de grande lapso temporal pode ser suficiente para que os responsáveis pelos crimes aqui discutidos gastem todo o dinheiro auferido com a revenda dos animais, frustrando o pagamento dos prejuízos por eles causados.
Logo, para evitar amargar grandes prejuízos, os produtores rurais que são vítimas desses crimes podem resguardar seu futuro direito à execução patrimonial por meio, por exemplo, da penhora antecipada dos bens dos criminosos, evitando, com isso, o perecimento de seu ulterior direito mediante a eventual e proposital dilapidação do patrimônio obtido com a venda do gado furtado.
Como se vê, embora esses crimes tenham aumentado, os produtores rurais podem adotar muitas medidas para prevenir e frustrar a ação dos criminosos. Somente com a soma de esforços nesse sentido é que será possível alcançar novamente a já vivida paz no campo.
*Renato Dias dos Santos | Sócio fundador do escritório Renato Dias dos Santos Advocacia & Consultoria | Advogado atuante em Direito do Agronegócio | Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) | Graduado em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) | Membro da Comissão de Assuntos Agrários e do Agronegócio da OAB/MS | Integrante do Comitê Jurídico da Sociedade Rural Brasileira (SRB) | Site: www.renatodiasdossantos.adv.br | E-mail: advogado@renatodiasdossantos.adv.br
[…]; a recuperação judicial do produtor rural pode ser traduzida na autorização de um plano para o pagamento mensal de todos os seus credores sem o comprometimento de toda a sua renda.
[…] os grandes desafios do setor estão ligados, principalmente, à ineficiência da logística em todo o território nacional, à falta de armazenagem estática, aos entraves do seguro agrícola e às dificuldades relacionadas ao crédito rural, tratando-se, portanto, de uma conjuntura que remonta à própria formação da nossa economia agrícola.
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